Durante vários anos, a Europa fechou os olhos aos milhares de milhões de euros que chegaram da Rússia. Tem-no feito também com outros países, de vários continentes, que, curiosamente, partilham regimes mais autocráticos e opacos, sem que daí advenha qualquer consequência. Mas, como vemos, tudo tem um preço.

Ao mesmo tempo que dávamos as boas-vindas ao capital com origem duvidosa, não deixa de ser irónico que fossem também aprovadas inúmeras iniciativas legislativas que culminaram na aprovação de leis, directivas e regulamentos em torno do branqueamento de capitais que pouca eficácia têm nestas situações.

Nas diversas investigações levadas a cabo pelo consórcio de jornalistas dos Panama Papers, países como Chipre, Malta, Suíça ou as offshores britânicas aparecem frequentemente mencionadas como paraísos como forma de branquear os capitais, sendo que boa parte serve para influenciar governos ou interesses.

Esta facilidade de movimentação de milhares de milhões de euros russos deu a Putin uma base de construção para o seu plano de ação. Nos últimos seis anos, o Banco Central da Rússia vendeu quase todos os dólares americanos e comprou ouro e yuans, a moeda chinesa, protegendo-se assim de sanções e de um bloqueio total da sua economia.

Mas não é só a nível financeiro que as peças se movem. A nível político, durante longos anos, também foram acauteladas as devidas influências. Gerard Schroeder, antigo chanceler da Alemanha, país que até hoje tem uma dependência superior a 50% das importações de gás russo, assumiu cargos relevantes no maior grupo petrolífero russo, a Rosfnet, e interesses no gasoduto “Nord Stream 2”, que esta semana abriu falência.

A Zona Euro deu por garantida a paz, que esteve na base da sua origem, tendo perdido a oportunidade de criar um mercado único de energia, de transportes, de telecomunicações, aviação, bancário, entre outros, diminuindo a dependência de terceiros, muito por incompetência e interesses duvidosos dos próprios países europeus.

A euforia da globalização e o acesso a mercados emergentes, conjugada com a importação de produtos baratos, dando uma aparente melhoria das condições de vida, camuflou a necessidade de garantir a independência da sociedade europeia.

Os sucessivos entraves à integração das economias europeias, tendo o proteccionismo e os nacionalismos como mote, estão agora a ter consequências desastrosas. A título de exemplo, o preço do gás importado pelos europeus já aumentou onze vezes no último ano, enquanto que o preço do gás americano “apenas” duplicou.

A Europa arrisca-se, mais uma vez, a perder competitividade para todos os blocos económicos mundiais e a empobrecer – uma tendência que já era realidade pela deslocalização de indústrias para outros continentes.

Assim, estaremos perante a derradeira oportunidade da Zona Euro se tornar independente, unir e concretizar para os europeus o seu sonho de integração e prosperidade.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.